História do Chevette - Parte 2 - O "Pequeno Chevrolet"

 Durante a fase de testes do Chevrolet Chevette no Brasil, profissionais designados como "pilotos de testes" eram os responsáveis por realizar os testes em estradas e ruas de São Paulo. Acompanhados por membros do Departamento de Engenharia, os pilotos registravam minuciosamente todas as impressões obtidas durante os testes. Entre as vias mais utilizadas para os testes estava a antiga estrada que ligava São Paulo a Santos, uma serra com curvas sinuosas e subidas íngremes que se mostrou uma excelente pista para avaliar a "tropicalização" dos carros, ou seja, a adaptação ao clima tropical brasileiro, com temperaturas elevadas e chuvas frequentes. Curiosamente, essa mesma estrada era utilizada como campo de provas pelas pioneiras Simca, Willys e Vemag durante toda a década de 1960.

Primeiros flagras do Opel Kadett B rodando em testes no Brasil

Na fase inicial dos testes, os carros utilizados possuíam mecânica original, já que ainda não havia uma definição de qual delas seria aproveitada no Chevette. O Opel Ascona A, com 4,12m de comprimento, apresentava um porte mais robusto, com opções de motores de 1.600cc, com potências de 79 e 93hp, além de outro de 1.900cc e 103hp. Por sua vez, o Opel Kadett B, com 4,10m, possuía motores menores, um de 1.100cc e 60hp, e outro de 1.400cc com 70hp. Já era cogitado dentro da empresa que o último motor seria o mais adequado para o carro brasileiro, devido à baixa octanagem da gasolina nacional.

Durante a fase de desenvolvimento do T-Car no Brasil, a equipe responsável pelo projeto tinha um desafio bastante diferente daquele dos designers nos Estados Unidos. Enquanto nos EUA, cada designer era designado para desenhar um detalhe específico do automóvel, no Brasil, a equipe liderada por Luther Whitmore Stier tinha que desenhar de tudo um pouco. Além de Stier, a equipe incluía Juan Besó, um espanhol que havia trabalhado na Opel, e Giuseppe Chiusiano, um estilista italiano, juntamente com um grupo de designers brasileiros de renome: Adalberto Bogsan Neto, que havia estagiado no Centro Técnico da GM Corporation, em Warren, trabalhando com Larry Shinoda, Nelson Santos Barros, o criador do emblema manuscrito "Chevette", Edgar Mazzacato e Laidner Rolin, que infelizmente faleceu muito jovem, antes mesmo do lançamento do carro.

Início do processo de modelagem. Imagem melhorada por IA

Esta era uma época em que a tecnologia dos computadores ainda não havia evoluído o suficiente para atender às necessidades do departamento de design da GM no Brasil. Os computadores mais avançados ocupavam espaços enormes e faziam uso de fitas magnéticas e cartões perfurados. Assim, todos os desenhos do T-Car foram feitos à mão, em papel mylar, que não permitia deformações.

Após a criação dos desenhos, o material do departamento de estilo era transferido para a modelagem, liderada por Leo Kunigk Neto. Esse setor era dividido em duas grandes áreas: "modelos para a fundição" e "modelos padrão", sendo que o último era composto pelas áreas de "dispositivos" e de "modelos copiadores".

A estrutura já começava a ganhar as primeiras linhas externas. Imagem melhorada por IA

Enquanto os profissionais responsáveis pelos modelos para a fundição começavam a fazer as peças do T-Car em isopor, adicionando, ainda, camadas de materiais diversos, para compensar a contração dos metais empregados nos protótipos, conforme o material que seria utilizado (ferro, aço, alumínio, etc.), o pessoal dos modelos padrão transferia as linhas do futuro veículo do mylar para as chapelonas de alumínio (um tipo de molde).

Além disso, os profissionais da GM começaram a experimentar com a utilização de enormes blocos de isopor, sobre os quais também seriam acrescentados Clay (um tipo de argila que amolece quando aquecida e endurece quando resfriada), plástico, metal, madeira e fibras para a criação dos modelos padrão. Esses modelos eram usados para testar o design do carro, bem como para avaliar a ergonomia, a aerodinâmica e outros aspectos importantes do veículo.

Protótipo em fase final de modelagem, definição das linhas da traseira. Imagem melhorada por IA

A habilidade e precisão dos modeladores foram fundamentais para transformar as ideias dos designers em realidade. Utilizando as "chapelonas", os modeladores preenchiam os vãos entre os blocos, eles foram capazes de unir as partes e dar forma à carroceria em escala natural. Cada detalhe meticulosamente trabalhado, desde a curvatura suave dos para-choques até as linhas arrojadas do capô.

Quando a carroceria finalmente ficou pronta, exatamente igual à que seria produzida para as ruas, cópias foram feitas para os trabalhadores da usinagem e demais envolvidos na fabricação das matrizes de estampagem e ferramentas diversas. Cada protótipo, produzido com cuidado e atenção aos mínimos detalhes, foi submetido a rigorosas verificações de formatos e medidas, que deveriam estar estritamente dentro da especificação planejada.

Testes de resistência e durabilidade dos bancos. Imagem melhorada por IA

Cinquenta habilidosos modeladores trabalharam incansavelmente em regime de horas extras, dedicando ao todo cerca de 75 mil horas em modelagem para transformar a ideia em realidade.

Enquanto isso, na Alemanha, o desenvolvimento do motor cross-flow de quatro cilindros em linha estava em andamento e a equipe estava animada com os resultados. Em abril de 1971, os primeiros quarenta protótipos foram finalizados e quatorze deles, com cilindradas que variavam entre 1.100cm³ e 1.700cm³, foram despachados para o Brasil.

Os protótipos dos motores funcionavam por centenas de horas seguidas durante os testes

O laboratório da GMB realizou testes de durabilidade e funcionamento em oito dos protótipos enviados, submetendo alguns deles a intensas sessões de dinamômetros por cerca de 500 horas seguidas. Outros foram ligados e desligados ininterruptamente, incríveis 15 mil vezes. Todos os resultados foram cuidadosamente analisados, a fim de garantir a qualidade e desempenho desejados.

Já definido o projeto do motor, se tornou o modelo para a construção dos demais.

Na busca por um desempenho esportivo superior, a engenharia experimental recorreu a soluções de alta tecnologia, como uma taxa de compressão elevada e um carburador Weber duplo de 48mm, para desenvolver um dos propulsores que chegou a gerar cerca de 102cv. No entanto, levando em consideração a qualidade da gasolina disponível no mercado brasileiro e com o objetivo de conciliar um desempenho razoável com a máxima economia, os técnicos optaram não apenas pela cilindrada de 1.400cm³, mas também por uma taxa baixa de 7,3:1, permitindo obter apenas 68cv. Esse motor, que seria usado no modelo de série, utilizava um modesto carburador Solex 32 (com difusor de 27mm) ou um DFV 32 (com difusor de 28mm).

Apresentação do motor do Chevette para executivos da GM


No final de 1971, a revista Quatro Rodas publicou ilustrações que revelavam o provável estilo final do carro. De acordo com a reportagem, o veículo era baseado no Ascona, mas contava com componentes do Kadett. O motor ainda era um mistério, assim como o restante da mecânica, havendo apenas especulações. Essa aparição na revista serviu para aguçar ainda mais a curiosidade do público, que já aguardava ansiosamente o lançamento do mini carro da GM.

Primeiro flagra do modelo já em sua carroceria definitiva, detalhe para a grade "disfarçada" de Opel Kadett B

No próximo capítulo, vamos dar mais detalhes sobre a rotina de testes dos protótipos no Brasil, os flagras da época e as especulações do mercado que já lançava projeções e palpites sobre o Chevette. Fique ligado na nossa página do instagram @tocadochevette para não perder nenhuma parte do Especial Chevette 50 Anos!

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